segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O Big Brother e o Brasil

A maior discussão da semana passada girou em torno do estupro, não-estupro ou abuso sexual ocorrido durante o programa Big Brother Brasil, que está na décima segunda edição. Em primeiro lugar, precisamos analisar quem são os responsáveis pelo programa ter chegado no ponto onde chegou.

Desde a edição anterior, o teor alcoólico do programa, a mando de seu diretor, aumentou. Alegou-se ainda que ele afirmou que valeria até violência no programa, algo que foi posteriormente desmentido. Mas daí percebe-se o clima de vale-tudo para aumentar a audiência de um programa que não nasceu para ter tantas edições, mas acabou caindo no gosto do povo e não parece que vai acabar tão cedo.

Recém-formado, trabalhei na quarta edição do programa como produtor de conteúdo para o portal na internet. Ao ser entrevistado para ingressar no trabalho, o então coordenador do site em perguntou se eu gostava do programa. A minha resposta foi "não" e, mesmo assim, fui contratado. Das coisas que percebi, três me chamaram mais a atenção: a edição do programa que vai ao ar é feita de tal forma que não exibe de fato um resumo do que aconteceu, mas direciona a opinião do público (aliás, a Globo mostrou que faz isso bem em 1989); de vez em quando, o áudio sumia e, aparentemente de forma inadvertida, os participantes mudavam de assunto e começavam a falar mal de um ou outro participante (seria a voz do Grande Deus, como eles chamavam?); por fim, o programa de atualização dos votos em tempo real, um dia, passou a se comportar de forma estranha, retornando somente múltiplos de mil na soma dos votos do paredão. Não estou dizendo aqui que os números sejam falsos ou manipulados, mas achei muito esquisito os votos, que deveriam crescer de forma errática, ficarem tão redondos.

A polêmica gerada em torno da cena do suposto estupro mostra que a televisão ainda não é livre para fazer o que bem entender. Mas o fato de não ter havido intervenção da direção do programa torna sua produção cúmplice do que quer que tenha acontecido lá dentro. E por mais que a suposta vítima negue ter sido estuprada ou sexualmente abusada, ela não parecia em condições de lembrar o que acontecera, pois, seguindo a diretriz do programa, embebedou-se à inconsciência.

Talvez seja mesmo a hora das emissoras de televisão do Brasil reverem seus conceitos. Caso contrário, talvez seja a hora de alguém rever esses conceitos por elas.

3 comentários:

  1. Aí é que mora o perigo. Quem vai decidir o que deve ou não passar na TV? Orquestraram tanto contra a censura dos governos dos presidentes generais, mas basta abrir uma brecha para quererem fazer igual aos governos "democratas" de Cuba, Coréia do Norte, China e tais...

    Ass: Caldeira

    ResponderExcluir
  2. É uma questão delicada. Mas liberdade de imprensa é um conceito vago, não existe realmente no Brasil (leia aqui um artigo sobre isso). O que é preciso não é censura, mas uma regulamentação. Por exemplo, proibir sexo explícito na TV aberta não é censura. Acho que o formato do programa deveria ser proibido pelo simples fato de infligir um certo grau de tortura aos participantes, que precisam escolher entre a clausura ou a humilhação pública da desistência.

    ResponderExcluir
  3. É isso aí Flavinho! Parabéns pelo texto!
    Sou contra a censura, mas a favor da regulamentação. Acho importante que se pense em alguma forma de proteger a sociedade. Claro que isso é uma brecha perigosa e sempre precisa ser feito com muito cuidado e com o envolvimento dos profissionais da área e da sociedade. Também acho importante que haja uma revisão e mais incentivos e fomentos à produção de mais programas sobre cultura e educação, por exemplo. Esses podem ser sim papéis do governo.
    Quanto ao BBB, acho uma lástima de programa. Não gosto desde o primeiro e não fico feliz pelo fato de um programa tão idiota durar tantas edições... Por enquanto, só nos resta, desligar a TV nessas horas.

    Acho muito importante um jornalista escrever sobre os bastidores, a edição e compartilhar opniões sobre a "a outra face da moeda", como você fez. Muito legal!

    ResponderExcluir